Sou um chato. Monótono e monocórdico, raramente resvalo. Passo dias observando os mesmos objectos, repetida e insipidamente pasmado. Mudo de olhos, sim, mas não mudo de motivo. A monotonia agrada-me. O meu samba é de uma nota só e é divino. Outras notas podem entrar, mas a base é uma só… etc.
Quando me sento ao piano, toco com o indicador direito. Sai uma coisa qualquer, provavelmente inesperada (um analfabeto musical nunca sabe que som vai sair de uma tecla), mas sempre sublime. E o que procuro a seguir? Outra nota? Não! Procuro a mesma, tocada em outra tecla, com outro dedo. Mas a mesma. Passei a minha vida à procura de uma mulher que conheci aos 15 anos. Quando achava que a tinha encontrado, casava-me. Afinal não era ela. Divórcio, que é a mesma coisa que a procura monocordicamente incessante, mas tocada por outro dedo, vista por outros olhos, abordada pelo outro lado da paixão.
(Decididamente amo obsessivamente a monotonia, pelo bem que traz ao mundo. Não é ela que previne a SIDA?...)
(Imagem daqui)
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